Às vezes pode parecer que você já conhece todos os tipos de abordagens e visões criativas, já que muitos artistas estão sempre de olho em seus colegas e na área das artes. Mas isso até você conhecer o Mykhailo Skop, artista de Lviv, que adora a idade média e é diretor de arte em uma empresa de produção de jogos de tabuleiro.

Mykhailo possui uma opinião muito única sobre a arte. Segundo ele, a criatividade nada mais é coletar sinais e criar novos significados. Ele não acredita em inspiração, mas sim em gatilhos que o ajudam a interpretar melhor suas ideias para outras pessoas. Ele é um dos artistas que se juntou ao Projeto Revival para criar NFTs para apoiar a Ucrânia.

Ficou curioso(a)? Confira a entrevista completa com Mykhailo Skop.

Criatividade como processo de coleta de sinais

Criatividade é comunicação, e cada projeto em que trabalho eu vejo como uma coleção de sinais. O mundo inteiro é uma coleção de miríades e sinais. E o dever do artista é encontrar essas conexões e criar novos significados a partir de combinações de imagens específicas.

Sempre que isso acontece eu fico animado. Mas o mais importante é que as outras pessoas também entendam a mensagem. Para mim, o princípio “sou artista e essa é a minha visão” não funciona. Um artista deve se comunicar com as pessoas. Isso não quer dizer que você precisa ser óbvio, você pode muito bem dizer algo que não é compreensível para todos, mas que desperte o gatilho do interesse, porque certos códigos visuais são acionados. E o meu dever principal é encontrar esse gatilho.

Lviv-Based Artist Mykhailo Skop on Board Game Design, Medieval Art, and Wartime Posters

Infância e o fatalismo

Como meus pais, Lev Skop e Halyna Druzyuk, são historiadores de arte e restauradores, minha infância foi baseada em Idade Média, estudos de arte, tradições e história ucraniana. Isso teve uma forte influência sobre minha formação e profissão. Desde pequeno eu tinha um sentimento de fatalismo, que foi moldado naturalmente pois nós, ucranianos, de tempos em tempos encontramos eventos épicos (feitos poderosos de heróis ou truques terríveis de ladrões). Mas esse fatalismo expõe a globalidade, não a desgraça. Podemos entender e sentir algo profundo, que não precisa ser explicado.

Lviv e seu patrimônio cultural

Lviv é uma cidade com outono e inverno dourados, de ruas antigas, paralelepípedos e pátios sem fim. É onde tudo se é pendurado com linho, e as pessoas que percorrem as escadas esculpidas se sentam em suas varandas para tomar café todos os dias. Estas são coisas locais que os turistas nunca irão perceber. Lviv tem tudo a ver com o seu ambiente.

Quando o assunto é marco arquitetônico, acredito que um edifício não pode ter um significado integral, pois o contexto tem que ser levado em consideração. Não posso apenas olhar para a Igreja Dominicana ou para Basílica Arquitetônica da Assunção da Bem-Aventurada Virgem Maria, pois juntas, elas formam um único conjunto. Adoro coisas antigas, como vestígios góticos, renascentistas e do século 17. Às vezes, gosto de descer em porões antigos ou até mesmo abrigos antiaéreos e olhar para os arcos góticos. Isso é uma das coisas que me deixa feliz. Gosto de explorar coisas que mostram a totalidade. A beleza e as diferentes camadas da cidade.

Além disso, Lviv é uma cidade diretamente ligada à influências. Embora ela sempre tenha sido um centro comercial que abrigou diferentes povos de diferentes religiões, com o passar dos anos isso moldou a cidade para o que ela é atualmente.

Historic center of Lvov city at night close up stock image

As lembranças mais felizes da infância

Quando eu era criança, no Natal, eu e meus pais tínhamos o costume de ir às igrejas, ver as decorações festivas, visitar o centro da cidade, as lojas. A cidade, naquela época do ano, era vista como se fosse um conto de fadas, era diferente de qualquer outra época do ano, ela ficava irreconhecível.

Como meus pais sempre trabalhavam com arte antiga, eu tenho muitas lembranças de museus. Eu sentava e olhava para coisas que ninguém podia ver. Me lembro dos cofres, eles eram incompreensíveis. O lugar armazenava diversos tesouros, mas era quase todo fechado para outras pessoas.

Óbvio, era possível ir à prefeitura, à Torre Kornyakt, mas o que sempre me atraia mais era visitar porões e escadarias para explorar áreas escondidas. Por exemplo, uma vez minha mãe inspecionou a base da torre da Igreja do Jesuítas, onde se podia ver vestígios do incêndio que ocorreu em 1874. Por fora, a igreja parece nova, mas por dentro ainda existe vestígios de fuligem. E já se passaram 148 anos!

A arte medieval e sua percepção nos dias atuais

Ao mesmo tempo em que a arte sacra precisa ser expressiva e de fácil compreensão, ela também precisa ser misteriosa. Por isso, ela traz mensagens óbvias e muitas vezes banais. Só que tudo isso depende exclusivamente da sua relevância, se as pessoas podem fazer a conexão entre uma certa imagem à sua realidade. Por exemplo, uma pessoa moderna provavelmente não irá conseguir entender o significado de uma miniatura medieval, pois ela traz códigos visuais que eram entendidos naquela época. Só especialistas podem ler estes códigos atualmente. Cada época possui seus códigos, então não imito a arte sacra antiga, como se ela fosse a melhor, mas eu uso os seus princípios.

Arcana Belli tarot deck Mykhailo Skop

Trabalhar como diretor de arte na Hiatus Game

Em paralelo ao meu trabalho de pesquisa, sou diretor de arte da Hiatus Games, uma empresa especializada na produção de jogos de tabuleiro. Estou envolvido em tendências artísticas, especificamente a imitação de estilos históricos. Não tenho interesse em criar arte digital universal. Sou contatado quando a reprodução de um códice medieval é necessária, como foi para o jogo Deus lo Vult, assim como memes “medievalizados”. Além disso, criei uma série de desenhos que imitam as miniaturas de Radziwiłł. Antes da invasão russa acontecer, trabalhei em um projeto local chamado “Lifestyle. Ancient Cities” que conta como viviam os antigos habitantes de Kiev. Uma série de ilustrações juntou as realidades de uma Kiev moderna com o estilo da Crônica Radziwiłł do século XV em uma perspectiva artística apropriada. Adoro esses tipos de projetos!

Uma das perguntas que mais adoro receber é: “Como você fez isso?”. Para mim, uma pessoa não pode cogitar que algo foi criado digitalmente. Ao copiar ou imitar algo, independentemente de como seja feito, é crucial repetir os passos do criador. Com a ajuda de um computador, é possível redesenhar tudo rapidamente pixel por pixel, mas isso não é interessante. Eu tento sempre repetir o processo técnico original. Quando se trata de uma miniatura medieval, primeiro faço um desenho preto, depois preencho com cores básicas, sombras e assim por diante.

É necessário copiar várias vezes para aprender. Existem milhares de imagens na internet para você escolher e copiar quantas vezes forem necessárias. Por exemplo, ao desenhar uma miniatura medieval dez vezes, na próxima vez, você conseguirá desenhar automaticamente o rosto exato que deseja.

Inspiração e arte durante a guerra

Para ser sincero, eu não sei o que é inspiração; meu trabalho é baseado em gatilhos. Quando me impressiono com algo, começo a coletar os sinais rapidamente para compartilhar essa emoção com outras pessoas. Entretanto, existe outra coisa. A arte existe por conta da arte; é sobre cultura e percepção. Isso significa que ao dar sentido às coisas e criar algum contexto, podemos ver uma questão social ou até mesmo outras questões através de uma perspectiva subjetiva. É sobre nós, não sobre a aplicação prática. Quando é necessário seguir regras para criar a arte, ela deixa de ser arte. Pode ser ilustração, pode ser decoração artística, mas não arte.

Em tempos de guerra, é possível ver muitos cartazes, cujo objetivo é comunicar a visão de alguém e evidenciar os eventos. Existe um propósito prático aqui, e isso é determinante.

Agora, essa arte é realmente necessária. Ela é, na verdade, uma reação. E a reflexão, que não pode ser direta e inequívoca, é a base da arte pura. Atualmente, isso é praticamente impossível, porque a reflexão surge apenas quando há uma distância física e emocional do evento. Por exemplo, é mais fácil refletir sobre a Segunda Guerra Mundial hoje, porque não está acontecendo agora: olhamos para eventos e criamos contextos. Contudo, somos parte do sistema e não podemos simplesmente observá-lo de forma abstrata, enquanto a guerra está acontecendo na Ucrânia.

Em apoio à Ucrânia, criei inúmeros cartazes. O objetivo principal é alcançar pessoas de diferentes continentes em uma linguagem visual, para que a Ucrânia não seja esquecida e não percamos nossa vantagem no campo de batalha da informação. Eu tento retratar as realidades da nossa luta através de cartazes, aplicando os princípios básicos da iconografia e xilogravuras folclóricas. Crio meus trabalhos em ciclos, sendo, Mariupol-Azov, um dos mais importantes. Refleti sobre a luta da cidade enquanto criava essas obras, assim como o futuro de nossos heróis mantidos em cativeiro por invasores russos. Outra coisa que adoro fazer é trabalhar com cartas de tarô. Por este motivo criei o ciclo de cartas “Arcana Belli”. Eu mesclo o layout clássico do deck Rider-Waite de Pamela Smith com imagens de guerra. Este deck será lançado no final de 2022.

Confira mais entrevistas com artistas ucranianos aqui:

– A Arte Durante a Guerra: Como Ilustradores Ucranianos Espalham a Verdade e Cooperam com a Mídia Global (Parte 1)

– A Arte Durante a Guerra: Como Ilustradores Ucranianos Espalham a Verdade e Cooperam com a Mídia Global (Parte 2)

– O Projeto Revival: Explore a Herança Cultural da Ucrânia, Histórias das Comunidades Locais e Artes NFT à Venda

 

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